Saúde bucal na gestação

Tais Almeida Santana

A gestação é um momento de muitas mudanças na vida mulher, que reflete no bem-estar do seu bebê e dos seus familiares. Nuances essas ligadas a fatores bio-psico-sócio-cultural, sendo um período em que a mulher se encontra muito sensível e susceptível a alterações na cavidade bucal. 1,2

O aumento na produção de progesterona e estrogênio, assim como mudanças metabólicas e comportamentais provocam uma desregulação da flora oral, deixando a mulher vulnerável a acometimentos do tecido de suporte e sustentação do dente, sendo uma grande candidata ao aparecimento de gengivite, da cárie, do granuloma piogênico e de doenças periodontais. 3,4,5

 Os episódios de vômitos podem provocar a desmineralização do esmalte, principalmente na face palatina, podendo estar presente em algumas mulheres, tal desfecho impossibilita a escovação dos dentes, fazendo com que ela se sinta indisposta para tal atividade. 2,4,5

Nesse caminhar, se torna papel essencial e preponderante a atuação do cirurgião-dentista para com esse público, conhecendo os cuidados bucais pertinentes a cada trimestre gestacional, promovendo o cuidado integral e a assistência dos direitos a essa mulher como garante a Rede Cegonha, criada em 24 de junho de 2011 pela portaria n° 1.459 do Ministério da saúde.6

O primeiro trimestre é um período menos apropriado para realização de procedimentos odontológicos, pois nesse momento está ocorrendo a formação do bebê. 2 É um momento de descobertas para a mulher, na qual ela trará seus anseios, seus medos e pode estar elencado a presença de náuseas e vômitos.1 Logo é um estágio de criação de vínculo do dentista e sua equipe com a gestante, seu parceiro e familiares, esclarecendo possíveis dúvidas, envolvendo essa gestante e os coparticipantes na assistência ao seu cuidado. 2

Nesse primeiro contato o dentista irá realizar a consulta odontológica (executar um bom exame clínico, controle de biofilme, profilaxia, escovação supervisionada e fomentar a educação em saúde). 7 Observar se a caderneta da gestante está preenchida, completar a parte do odontograma, ver as vacinas se estão em dia, dentre outras questões pertinentes ao cuidado multidisciplinar no pré-natal. Buscando ativamente as gestantes da sua área, incentivando a mesma a participarem de grupo das gestantes na unidade de atenção básica, caso tenha, e se não tiver, suscitar a formulação desse grupo com toda equipe, propiciando com isso um momento acolhedor e de compartilhamento de ideias entre as futuras mamães, com o objetivo de estreitar laços e fortalecer o vínculo da gestante com a equipe. 7,2

No segundo trimestre já tem se a formação completa da embriologia do bebê, a barriga da gestante não está tão crescida, logo os procedimentos odontológicos já podem ser executados, como raspagem e alisamento supragengival, radiografias, exodontias, tratamento endodôntico. Nesse momento é importante reforçar as medidas de controle de biofilme já iniciadas no primeiro contato. 1,2

Já no terceiro trimestre é preferível o suporte a gestante, deixando as atividades de execução de procedimentos, caso haja para o pós-parto. Visto que nesse período temos algumas dificuldades inerentes ao mesmo, como o crescimento da barriga, dificuldade de respiração, sem falar que algumas gestantes podem apresentar crise hipotensiva e síncope, devido o risco de sufocamento da veia cava inferior e da aorta pelo útero. 2,3,4 A seguir listamos algumas recomendações que são proferidas no atendimento a gestante:

Em episódios de vômitos, aguardar um período de meia hora para escovar os dentes e fazer bochecho com água, flúor e bicarbonato de sódio.
Optar pelo uso do paracetamol, que se enquadra na classificação B do FDA, se mostrando seguro na utilização para gestantes.  
Evitar o uso de anti-inflamatório não esteroidais (AINES).  
Em casos de sinais flogísticos da inflamação, utilizar os antibióticos do grupo das penicilinas (Amoxicilina e ampicilina).
Em caso de pacientes alérgicos as penicilinas utilizar a clindamicina.
Caso o paciente apresente inflamações persistentes, pode lançar mão do uso do clavulanato mais amoxicilina.  
Preferir o uso de corticosteroides: Dexametasona ou betametasona em dose única de 2 a 4 mg.  
Não utilizar flúor em concomitância com cálcio, visto a redução da absorção de ambos em 50%.  
Não utilizar dipirona sódica no primeiro trimestre nem no último, devido ao risco de agranulocitose e hipotensão.
Evitar o uso de opioides, pois apresentam risco de anomalias congênitas e depressão respiratória.  
Não utilizar tetraciclinas, devido ao manchamento dos dentes e riscos ao feto.
Recomenda-se o uso de lidocaína 2% com epinefrina (máximo de dois tubetes).  
No 3° trimestre caso precise realizar alguma intervenção, elevar a cadeira (cerca de 15°), e deixar a gestante virada para o lado esquerdo.
FONTE: Andrade (2014); Naseem (2016); Brasil (2016); Oliveira (2017).

A partir das elucidações supracitadas se torna essencial a comunicação efetiva do cirurgião dentista e a sua equipe para proporcionar um cuidado holístico, integral e dinâmico no atendimento as suas gestantes, respeitando suas individualidades e necessidades.

Referências:

1. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Saúde Bucal / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. – Brasília: Ministério da Saúde, 2008. 92 p. – (Série A. Normas e Manuais Técnicos) (Cadernos de Atenção Básica; 17). Disponível em: file:///C:/Users/monica.brito/Documents/card%20sa%C3%BAde%20bucal%20e%20gestante/saude_bucal.pdf. Acesso em: 08 mar. 2022.

2. BRASIL. Ministério da Saúde. Protocolos da Atenção Básica: Saúde das Mulheres. Brasília: Ministério da Saúde, 2016. 230 p. Disponível em: file:///C:/Users/monica.brito/Documents/card%20sa%C3%BAde%20bucal%20e%20gestante/protocolos_atencao_basica_saude_mulheres.pdf. Acesso em: 08 mar. 2022.

3. Universidade Federal do Maranhão. UNA-SUS/UFMA. Saúde Bucal da Gestante: Acompanhamento Integral em Saúde da Gestante e da Puérpera/ Ana Emília Figueiredo de Oliveira; Ana Estela Haddad (Org.). – São Luís: EDUFMA, 2018:117p. Disponível em: https://ares.unasus.gov.br/acervo/handle/ARES/10865. Acesso em: 08 mar. 2022.

4. Naseem, M. et al. Oral health challenges in pregnant women: Recommendations for dental care professionals. The Saudi Journal for Dental Research, v. 7, n. 2, p. 138–146, 2016.

5. Gonçalves, K.F. Cuidado odontológico no pré-natal na atenção primária à saúde: dados do PMAQ-AB. 2016. 73 p. Dissertação (Mestrado em Odontologia) – Programa de Pós-graduação em Odontologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. 2016. Disponível em: https://lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/150274/001008775.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em: 08 mar. 2022.

6. Marques, C.P.C. Redes de Atenção à saúde: A Rede Cegonha. São Luís: EDUFMA, 2015. Disponível em: https://ares.unasus.gov.br/acervo/html/ARES/2445/1/UNIDADE_2.pdf. Acesso em: 08 mar. 2022.

7. BRASIL. Ministério da Saúde. Diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal. Brasília, 2004. Disponível em: http://189.28.128.100/dab/docs/publicacoes/geral/diretrizes_da_politica_nacional_de_saude_bucal.pdf. Acesso em: 08 mar. 2022.

8. Andrade, E.D. Terapêutica medicamentosa em odontologia. 3. ed. São Paulo: Artes Médicas, 2014.

9. Oliveira, P.J. Analgesia da Dor em Pacientes Comprometidos Sistemicamente. Odonto UP. 2017. Disponível em: http://odontoup.com.br/analgesia-da-dor-empacientes-comprometidos-sistemicamente/. Acesso em: 08 mar. 2022

 

Colunista:

Tais Almeida Santana – cirurgiã-dentista; residente em Saúde da família (FESFSUS).

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