Atendimento odontológico a pacientes com cardiopatias.

Sara Ribeiro
Kátia Coutinho

Cirurgiões-dentistas têm buscado nos atendimentos odontológicos individualizar e humanizar os pacientes, para isso, entender as doenças de base, suas implicações e as abordagens necessárias para uma consulta mais segura tem sido uma prioridade. Segundo a Sociedade Brasileira de Cardiologia, no ano de 2022, no Brasil, cerca de 14 milhões de pessoas têm alguma doença cardiovascular e, pelo menos, 400 mil mortes ocorrem por ano, em decorrência dessas enfermidades, o que corresponde a 30% de todos os óbitos no país.

Apesar da hipertensão arterial não ser considerada em sua definição como uma cardiopatia, é uma doença que atinge milhões de brasileiros e ocorre por conta de uma descompensação nos níveis de sangue nas artérias. Uma doença sem sintomatologia o que a torna muito perigosa (SOUTHERLAND JH, et al., 2016). Segundo a Organização Mundial da Saúde, pacientes com pressão maior do que 140x90mmHg ou aqueles que fazem uso de medicação para se manter abaixo desses parâmetros são considerados hipertensos. Os pacientes portadores dessa condição podem ser atendidos, desde que estejam estáveis, com a pressão arterial normalizada, e fazendo uso correto da medicação prescrita pelo cardiologista e mantendo o devido acompanhamento medico. Em casos de descompensação, se faz necessário um encaminhamento para consulta com cardiologista e uma reavaliação e relatório do quadro de saúde desse paciente.

As cardiopatias são definidas como distúrbios que afetam o coração e o sistema vascular de um indivíduo e as mais comuns são arritmias cardíacas, angina pectoris, insuficiência cardíaca congestiva e infarto do miocárdio.

De acordo com TEIXEIRA et al. (2008), as arritmias se tratam de uma anormalidade no ritmo do coração que pode ter origem nos ventrículos ou átrios, podendo ser assintomática ou não. Normalmente não apresentam risco grave ao paciente durante o atendimento odontológico, mas podem evoluir para um quadro de angina estável, infarto do miocárdio e até morte súbita, como cita ANDRADE et al. (2021). Um dos principais riscos é a ocorrência de crises de arritmia induzidas por estímulos externos, ocasionadas pelo aumento da frequência cardíaca e a pressão arterial, como os vasoconstritores presentes nos anestésicos locais e a manipulação dos dentes e tecidos adjacentes.

Por essa razão, é fundamental que o dentista esteja preparado para identificar e tratar uma arritmia caso ela ocorra durante o atendimento. É importante que ele tenha conhecimento das diferentes formas de arritmia e saiba como realizar manobras de emergência, como a desfibrilação e a massagem cardíaca. É primordial também, desenvolver técnicas de respiração, e sempre criar uma relação de confiança com esses pacientes, promovendo o controle da ansiedade, mais conforto e segurança no momento do atendimento.

A angina pectoris é causada por uma falta de vascularização nas artérias coronária, que gera uma ausência de oxigênio no músculo cardíaco de forma temporária. O sintoma clínico mais comum é uma dor intensa que indica que o quadro não está estável e precisa de cuidados mais intensos, pois pode causar um infarto (ANDRADE, 2014). Para o cirurgião-dentista é importante observar o paciente no momento da consulta, avaliando os sinais clínicos e informando o passo a passo do procedimento para evitar sustos e medo do que virá a acontecer durante a consulta.

Já a insuficiência cardíaca conforme o conceito estabelecido por ANDRADE (2014) é uma doença que diminui a contração e força  do músculo cardíaco, gerando um comprometimento na função de bombeamento do sangue. Os pacientes portadores dessa condição normalmente apresentam cansaço, fraqueza e falta de ar. É necessário que o dentista promova consultas mais curtas, sem estresses evitando que a pressão arterial aumente. Se necessário e dependendo de qual tratamento esse paciente necessite, o encaminhamento para centros mais especializados e até o uso de sedação hospitalar é uma opção que viabiliza uma segurança maior no atendimento (TEIXEIRA et. al., 2008).

Por fim, o infarto do miocárdio, também conhecido como ataque cardíaco, é a cardiopatia que mais gera insegurança no profissional nos atendimentos odontológicos. Se caracteriza pela obstrução de uma ou mais artérias coronárias gerando uma necrose tecidual ao redor do miocárdio por falta de suprimento sanguíneo (ESTEVES et al., 2011). Acomete em sua maioria idosos a partir dos 65 anos de idade e os sintomas se assemelha ao da angina, sendo uma dor intensa, parecida com um aperto ou pressão na região do peito. Essa dor pode irradiar para região da mandíbula e para ombro e braço esquerdo, também podendo ocorrer episódios de náuseas e vômitos.

 Os pacientes que sofreram um ataque cardíaco devem aguardar no mínimo 6 meses para realizar tratamento odontológico, mas podem comparecer a consultas de rotina para avaliações. É importante uma relação multiprofissional entre o médico cardiologista, o enfermeiro e o dentista para desenvolvimento e acompanhamento de bom plano de tratamento.

A endocardite bacteriana é umas das complicações mais temidas pelo cirurgião-dentista ao tratar um indivíduo portador de cardiopatia. Caracteriza-se pela inflamação do endocárdio causada por bactérias que entram na circulação sanguínea, contaminando especialmente a superfície das valvas cardíacas. Embora haja uma taxa de correlação (entre 4% a 20%), a maioria dos casos não se inicia por procedimentos odontológicos, mas sim por bacteremias espontâneas (MALAMED, 1997).

Essa complicação tem uma alta taxa de mortalidade, e ainda que não leve ao óbito, leva a um grande comprometimento da qualidade de vida (MALAMED, 1997; FURTADO; MORAIS, 2007).Dessa forma, é imprescindível a prevenção de casos de endocardite, através da Profilaxia Antibiótica, em pacientes cardiopatas. Os procedimentos que requerem profilaxia antibiótica são extrações, procedimentos periodontais,  colocação de implantes e reimplante de dentes avulsionados, tratamento endodôntico, e limpeza profilática de dentes ou implantes; ou seja, procedimentos nos quais o sangramento é provável (AMERICAN HEART ASSOCIATION, 2008).

A medicação de primeira escolha para profilaxia antibiótica é a amoxicilina, devido à sua segurança e poucos efeitos adversos, além do bom espectro de ação e efetividade pros patógenos envolvidos com a endocardite, sendo indicado o uso de dose única de 2g via oral, uma hora antes do procedimento

Quanto aos pacientes alérgicos à penicilina, pode haver a substituição pela clindamicina, azitromicina ou cefalosporina. A eritromicina não é mais indicada devido aos intensos seus efeitos colaterais gastrointestinais. (AMERICAN HEART ASSOCIATION, 2008).

Com o aumento da expectativa de vida e, por conseguinte, do número de idosos que buscam a assistência e que necessitam de tratamento diferenciado nas unidades de saúde da atenção básica no Brasil; torna-se necessário levar em consideração os processos relacionados ao envelhecimento, como por exemplo, as cardiopatias, de um modo geral.

É imprescindível a avaliação e atuação de forma interdisciplinar, visando à promoção de saúde e prevenção de complicações ou agravos destes pacientes que já estão dentro de um grupo de risco, sendo assim é um grupo prioritári, desta forma, cabe aos profissionais de saúde; em especial o Cirurgião-Dentista; buscar maior conhecimento das alterações cardiovasculares, suas complicações, tratamentos e manejos adequados, para que seja oferecido tratamento de qualidade e com segurança aos pacientes.

COLUNISTAS

Sara Elian Ribeiro – cirurgiã-dentista; pós-graduanda em Implantodontia, Periodontia e Prótese; discente de Mestrado do Programa de Pós-graduação em Odontologia e Saúde da Universidade Federal da Bahia.

Kátia Coutinho – cirurgiã-dentista; pós-graduada em Reabilitação Oral (Prótese, Implante e Perio); Imunologia e Anatomia; discente de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Odontologia e Saúde da Universidade Federal da Bahia.

REFERÊNCIAS

ESTEVES, J. C. et al. Assistência cirúrgico-odontológica a pacientes com história de infarto do miocárdio. RGO – Rev Gaúcha Odontol. v. 59, n. 2, p. 285-291, 2011.

TEIXEIRA, C. S. et al. Tratamento odontológico em pacientes com comprometimento cardiovascular. RSBO; v. 5, n. 1, p. 68-76, 2008.

ANDRADE, E, D. Terapêutica medicamentosa na odontologia. 3.ed- São Paulo: Artes Médicas, 2014.

ANDRADE, Juliana Santana et al. Protocolo de atendimento odontológico em pacientes com múltiplas desordens sistêmicas: revisão de literatura. Revista Eletrônica Acervo Saúde, v. 13, n. 1, p. e5940-e5940, 2021.

AMERICAN HEART ASSOCIATION. Prevention of infective endocarditis: Guidelines from the American Heart Association. A guideline from the American Heart Association Rheumatic Fever, Endocarditis and Kawasaki Disease Committee, Council on Cardiovascular Disease in the Young, and the Council on Clinical Cardiology, Council on Cardiovascular Surgery and Anesthesia, and the Quality of Care and Outcomes Research Interdisciplinary Working Group. JADA, v. 139, supl., p. 13S-24S, 2008.

MALAMED, S. F. Manual de anestesia local. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1997.

MONNAZZI, M. S. et al. Emergências e urgências médicas. Como proceder? RGO, v. 49, n. 1, p. 7-11, 2001.

NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH. What is angina? Disponível em:

<http://www.nhlbi.nih.gov/health/health-topics/topics/angina/>.

SOUTHERLAND JH, et al. Dental management in patients with hypertension: challenges and solutions. Clinical, Cosmetic and Investigational Dentistry, 2016, 8(1): 111-120.

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